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sábado, 8 de enero de 2011

Tinkunaco 0014/11 - FWD: [RED ALAL] ETERNIT CONDENADA NA BAHIA POR CAUSAR PLACAS PLEURAIS EM TRABALHADORES


Em decisão inédita, o Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região (BA) condenou a Eternit a pagar a um ex-trabalhador, indenização por danos morais no valor de R$100.000,00 (cem mil reais), além da reparação das despesas médicas correspondentes, em virtude do desenvolvimento de placas pleurais decorrentes da contaminação por amianto (asbesto).
No mesmo julgamento, a eg. 2ª Turma do TRT/5 também se pronunciou sobre a prescrição que havia sido decretada pelo Juiz de 1ª instância. A esse respeito, o Tribunal considerou que o início da prescrição somente ocorreu quando o trabalhador teve conhecimento inequívoco da doença laborativa, afastando o entendimento anterior de que a contagem da prescrição seria da data do fim do contrato de trabalho. Importante salientar que as doenças relacionadas ao amianto são progressivas e, muitas vezes, somente se manifestam décadas após a sua exposição.
O contato com o amianto é responsável por vários tipos de doenças, dentre elas a ocorrência de placas pleurais. A vítima desse caso concreto, em razão dos quase 4 (quatro) anos em que trabalhou na Eternit, desenvolveu referida doença respiratória com graves prejuízos à sua qualidade de vida e, por isso, deverá ser indenizada.  
Abaixo, segue o inteiro teor do acórdão, com excelentes fundamentos jurídicos registrados pelo Relator, Exm.º Desembargador Cláudio Brandão.

2ª. TURMA
 
RECURSO ORDINÁRIO Nº 0070300-31.2008.5.05.0102RecOrd
 
RECORRENTE(s): Antônio Carlos dos Santos Gomes
 
RECORRIDO(s):  Eternit S.A.
 
RELATOR: Desembargador CLÁUDIO BRANDÃO
 
 
DANO MORAL. DOENÇA DECORRENTE DE EXPOSIÇÃO AO AMIANTO. PRESCRIÇÃO. TERMO INICIAL. O prazo de prescrição, em casos de responsabilidade civil decorrente de doença ocupacional, só tem início a partir da ciência inequívoca da incapacidade laboral (Súmula nº 278, STJ). Em se tratando de doenças decorrentes da exposição ao amianto, que, normalmente, surgem após um período de latência prolongado, em torno de 15 a 20 anos, não se pode pretender a fluência do prazo prescricional a partir da extinção do contrato de trabalho. Como enfermidade progressiva, e que, portanto, se agrava no tempo, somente flui com o conhecimento, pelo trabalhador, da origem e extensão dos danos que podem ocorrer, inclusive, apenas com a emissão de laudo pericial judicial. Precedentes do STJ (REsp Nº 712.721 – MG; REsp 202.846/SP; REsp Nº 669.691 – RJ; REsp 139.481⁄SP).
 
 
ANTÔNIO CARLOS DOS SANTOS GOMES, nos autos da ação em que litiga com ETERNIT S.A., inconformado com a decisão proferida pela MM. Juíza da 2ª Vara do Trabalho de Simões Filho, interpôs RECURSO ORDINÁRIO.
 
Apelo tempestivo e regularmente contrariado.
 
O Ministério Público do Trabalho emitiu o opinativo de fls. 944/948.
 
É O RELATÓRIO.
 
VOTO
 
PREJUDICIAL DE MÉRITO. PRESCRIÇÃO
 
Busca a Recorrente afastar a aplicação da prescrição total da pretensão, ao argumento de que o início da contagem do prazo, em caso de ação de indenização decorrente de doença ocupacional, deve ser a data da ciência inequívoca da incapacidade laboral.
 
Afirma, ainda, que somente em 16/09/2005 teve conhecimento de que é portador de placas pleurais bilaterais, conforme relatório emitido por médica da CESAT – Centro de Estudos da Saúde do Trabalhador.
 
Sustenta que “A saúde afetada no ambiente de trabalho significa a violação, de maneira definitiva e trágica, da integridade física e da vida do trabalhador” (fls. 908), razão porque considera imprescritível a pretensão decorrente, por ser originada de direito fundamental.
 
Razão lhe assiste.
 
Data venia do entendimento esposado pela i. Julgadora de origem, a meu sentir, a lesão proveniente do acidente do trabalho ou da doença ocupacional atinge os atributos inerentes à pessoa humana e, por isso mesmo, viola a denominada dignidade constitucional, o que faz atrair, por ausência de outra disposição normativa, a regra contida no art. 205, do CC, que fixa em dez anos o prazo prescricional.
 
Contudo, curvo-me ao posicionamento majoritário desta Turma, que aplica a trienal civilista, por entender que se trata de lesão de natureza extrapatrimonial que tem como suporte o Direito Civil, inclusive quanto ao prazo prescricional (art. 206, § 3º, V do CC).
 
Quanto ao marco inicial para a sua contagem, são necessárias algumas considerações.
 
É cediço que o prazo de prescrição, em casos de responsabilidade civil decorrente de doença ocupacional, só tem início a partir da ciência inequívoca da incapacidade laboral (Súmula nº 278, STJ).
 
Em se tratando de doença progressiva, como é o caso da pneumoconiose (vide item 2.3 do laudo pericial – fls. 803),
 
decorrente de inalação de poeiras inorgânicas (minerais) e orgânicas em suspensão nos ambientes de trabalho, levando a alterações do parênquima pulmonar e suas possíveis manifestações clínicas, radiológicas e da função pulmonar (fls. 801)
 
e que, portanto, se agrava no tempo, somente flui com o conhecimento, pelo trabalhador, da origem e extensão dos danos, o que, no caso dos autos, somente veio a se confirmar pelo laudo pericial (fls. 790/821).
 
É importante destacar, ainda, que, conforme descrito no laudo, as placas pleurais que acometem o autor “Normalmente, aparecem após um período de latência prolongado, em torno de 15 a 20 anos” (fls. 809), razão porque não se pode pretender a fluência do prazo prescricional a partir da extinção do contrato de trabalho.
 
Antes disso, não se pode concluir acerca do grau de comprometimento da doença e os seus efeitos na capacidade de trabalho, o que impede ao obreiro buscar, com segurança, a reparação pretendida.
 
É como vem decidindo o Superior Tribunal de Justiça, de acordo com as ementas em destaque:
 
Seguro. LER. Prescrição. Súmula nº 5. Jurisprudência consolidada na Segunda Seção. 1. No caso dos autos, ausente pedido administrativo, conta-se o prazo de prescrição da data em que o segurado teve ciência inequívoca da incapacidade, o que, no caso, somente ocorreu com a aposentadoria por invalidez permanente pelo INSS, não valendo para tanto simples afastamentos para tratamento. (grifos acrescidos)
 
(...)
 
3. Recurso especial não conhecido.
 
(BRASIL. STJ. RECURSO ESPECIAL Nº 712.721 - MG (2005/0001713-1). REL : MINISTRO CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO ; J. 13/12/2005)
 
Civil e Processual civil. Recurso Especial. Ação de cobrança de indenização securitária por invalidez permanente. Disacusia. Doença progressiva. Laudo pericial utilizado como prova emprestada.
 
Categoria de prova documental. Autenticidade não questionada. Violação ao art. 332 do CPC. Inocorrência. Prazo prescricional. Questionamento da validade do laudo pericial produzido em ação acidentária. Requerimento de produção de prova pericial. Termo a quo. Contagem a partir no novo laudo pericial.
 
- A jurisprudência do STJ é no sentido de que a disacusia é doença progressiva, que se agrava no tempo.
 
- A prova pericial trasladada para outros autos, como prova emprestada, passa à categoria de prova documental.
 
- O termo a quo para contagem do prazo prescricional de ação de segurado contra seguradora deve ser o momento em que o segurado obteve ciência inequívoca de estar acometido de moléstia incapacitante.
 
- Se a ré questiona a validade do laudo pericial produzido em ação acidentária movida pelo autor contra o INSS e requer a produção de prova pericial, não pode, por isso mesmo, pretender que a prescrição seja contada da data da realização daquele exame. (grifos acrescidos).
 
Recurso especial não conhecido.
 
(STJ. REsp 683187 / RJ. RECURSO ESPECIAL 2004/0118529-6. Rel.: Ministra NANCY ANDRIGHI. TERCEIRA TURMA. J.: 08/11/2005; Data da Publicação/Fonte : DJ 15/05/2006 p. 203 – Grifos acrescidos )
 
CIVIL. SEGURO DE VIDA E ACIDENTES PESSOAIS EM GRUPO. PRESCRIÇÃO ÂNUA. SÚMULA 101. TERMO INICIAL. AUXÍLIO-DOENÇA. INAPLICABILIDADE.
 
1. O prazo prescricional da ação contra o segurador tem início quando o segurado toma conhecimento da incapacidade laboral e da respectiva amplitude (CC/16; Art. 178, § 6º, II e Súmula 101).
 
2. O gozo de auxílio-doença do INSS não marca termo inicial da prescrição ânua para cobrança de indenização do segurado em grupo contra seguradora. É que o auxílio-doença, podendo ser transitório (Lei 8.213/91; Art. 59), não se vincula a incapacidade permanente.
 
Em regra, o segurado só tem ciência da incapacidade laboral, total ou parcial, mediante o conhecimento do laudo pericial. (REsp 202.846/SP, Rel. Ministro  HUMBERTO GOMES DE BARROS, TERCEIRA TURMA, julgado em 20/09/2004, DJ 17/12/2004 p. 512)
 
CIVIL - INDENIZAÇÃO - HIPOACUSIA BILATERAL - PRESCRIÇÃO VINTENÁRIA NÃO CARACTERIZADA - MOLÉSTIA QUE SE AGRAVOU COM O TEMPO - CONTAGEM DO PRAZO A PARTIR DO SEGUNDO LAUDO PERICIAL - DANO MORAL - VEDADA SUA FIXAÇÃO EM SALÁRIOS MÍNIMOS - QUANTUM INDENIZATÓRIO - VALOR EXCESSIVO - REDUÇÃO - FATO NOVO.
 
1. Infringência ao art. 177 do Código Civil de 1916 não verificada. Prescrição não caracterizada. Conforme assentado pelas instâncias ordinárias, a moléstia constatada em perícia anterior agravou-se com a continuidade na prestação dos serviços laborais. (...) (STJ.  RECURSO ESPECIAL Nº 669.691 - RJ (2004⁄0127142-1). REL.:  MINISTRO JORGE SCARTEZZINI; QUARTA TURMA. J.: JULGADO: 28⁄06⁄2005)
 
AÇÃO DE INDENIZAÇÃO DO SEGURADO EM GRUPO CONTRA A SEGURADORA. PRESCRIÇÃO. De acordo com a decisão recorrida, a prescrição não se verificou, também porque o segurado "só teve conhecimento a partir da alta medica daquela autarquia. Não é possível contar a prescrição a partir do acidente típico, porque as lesões não estavam consolidadas". Fundamento este que não foi valido e objetivamente impugnado (Sum. 283⁄STF). Matéria de prova, cujo reexame não cabe na instancia especial (SUM. 7⁄STJ). Recurso especial não conhecido." (REsp 139.481⁄SP, Rel. Ministro NILSON NAVES, DJU 09.12.1997).
 
Também a mais alta Corte Laboral tem reconhecido na consolidação da lesão o marco prescricional, como se colhe dos seguintes julgados:
 
RECURSO DE REVISTA. SUSPENSÃO DA PRESCRIÇÃO. GOZO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. Tratando-se de empregado em gozo de benefício previdenciário, o marco inicial para a contagem do prazo prescricional para o ajuizamento da ação é a data da comprovação, em exame pericial, da enfermidade ou da verificação da natureza da incapacidade, ou, ainda, da ciência inequívoca da incapacidade laboral, nos termos das Súmulas 230 do STF e 278 do STJ. No caso submetido à análise, o reclamante teve ciência inequívoca de sua incapacidade laboral na data da sua aposentadoria por invalidez, concedida em 18/05/2000. Assim, proposta a ação em 13/12/05, correta a decisão do Tribunal a quo que entendeu prescrita a pretensão do direito de ação, ainda que por outros fundamentos. Recurso de revista não conhecido.  (TST. RR - 74500-05.2005.5.09.0093 Relator Ministro: Emmanoel Pereira, 5ª Turma. Julg: 19/05/2010, DEJT 28/05/2010).
 
RECURSO DE REVISTA. PRESCRIÇÃO. MARCO INICIAL. CONSOLIDAÇÃO DA LESÃO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. SUSPENSÃO. PERCEPÇÃO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO OFICIAL. INOCORRÊNCIA. I) O afastamento do empregado em gozo de auxílio-doença ou aposentado por invalidez não enseja a suspensão do prazo prescricional para o exercício de pretensões decorrentes do contrato de trabalho, sejam verbas trabalhistas, sejam parcelas indenizatórias de danos decorrentes de acidente de trabalho. Precedentes da SBDI-1. II) O TST mantém posição no sentido de que o marco inicial da prescrição incidente sobre a pretensão de pleitear a reparação de danos decorrentes de doenças ocupacionais equiparadas a acidente do trabalho coincide com a consolidação das lesões comumente na concessão do benefício previdenciário oficial da aposentadoria por invalidez. Na espécie, uma vez que a aposentadoria por invalidez foi concedida em 07.04.04 e a presente demanda ajuizada em 12.09.07, a prescrição consumira as pretensões formuladas pelo Reclamante na presente demanda. Não conhecido.     (TST. RR - 134700-31.2007.5.15.0128 Data de Julgamento: 19/05/2010, Relator Ministro: Emmanoel Pereira, 5ª Turma, Data de Divulgação: DEJT 28/05/2010.)
 
RECURSO DE REVISTA. PRESCRIÇÃO. INDENIZAÇÃO. DANO MORAL. DOENÇA DO TRABALHO. MARCO INICIAL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. CIÊNCIA INEQUÍVOCA DA INCAPACIDADE LABORAL. DOENÇA OCORRIDA NA VIGÊNCIA DO CÓDIGO CIVIL DE 2002. AÇÃO PROPOSTA APÓS A EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 45/04.  1. Não há considerar como termo inicial da prescrição relativa à pretensão de indenização por danos morais e materiais decorrentes da doença do trabalho, a data da concessão, pelo INSS, de auxílio-doença, porquanto a concessão de tal benefício implica tão-somente o reconhecimento, pela aludida Autarquia, da patologia do trabalhador, não importando na ciência inequívoca, por parte deste, da sua incapacidade laborativa (Súmula 278 do STJ), até porque ainda não estabelecido o nexo de causalidade entre a doença e as atividades desempenhadas na empresa e tampouco sedimentada a irreversibilidade da doença - LER/DORT. 2. Embora necessário, em princípio, perquirir o prazo prescricional aplicável, se civil ou trabalhista, haja vista que, conquanto ajuizada a ação já na vigência da Emenda Constitucional 45/2004, o dano, objeto desta reclamação, ocorreu anteriormente à sua edição, tal aferição somente se faz imprescindível se -a aplicação automática da prescrição trabalhista leva à conclusão injusta que molesta gravemente o valor da segurança jurídica-   ( OLIVEIRA, Sebastião Geraldo de Oliveira .  Indenizações por acidente do trabalho ou doença ocupacional, 4ª Ed., LTr, São Paulo, 2007, p. 324). Não reduzido, pela aplicação da prescrição trabalhista, o prazo previsto na legislação civil, despicienda tal aferição. 3. Apenas suspenso o contrato de trabalho do reclamante (CLT, art. 475), por força da concessão de aposentadoria por invalidez em 25.11.2004, e ajuizada a presente ação em 8.2.2008, antes, pois , do transcurso do prazo quinquenal estabelecido no art. 7º, XXIX, da Carta Magna para a propositura de ação trabalhista em relação a contratos de trabalho ainda em curso, não há prescrição a ser pronunciada. Recurso de revista conhecido e provido.  (TST. RR - 26900-63.2008.5.12.0007 Data de Julgamento: 12/05/2010, Relatora Ministra: Rosa Maria Weber, 3ª Turma, Data de Divulgação: DEJT 28/05/2010).
 
Sobre o tema, oportuna, ainda, é a transcrição de lição do e. Jurista Sebastião Geraldo de Oliveira[1]:
 
(...) o adoecimento é um processo progressivo gradual (período de latência) que pode levar vários anos até atingir o grau irreversível de incapacitação total ou parcial para o trabalho. Normalmente, no início da enfermidade, o tratamento começa com simples acompanhamento médico, sem interrupção do trabalho; depois, com o agravamento dos sintomas e sinais clínicos, surgem afastamentos temporários, às vezes intercalados com altas e retornos ao trabalho; em seguida, ocorre afastamento mais prolongado, com o pagamento de auxílio-doença pela Previdência Social; finalmente, após a consolidação dos efeitos da doença ou do acidente, constata-se a invalidez total ou parcial para o trabalho.
 
[...]
 
A encapação pelo Direito Positivo brasileiro da teoria da actio nata, conforme insculpida no art. 189 do Código Civil de 2002 (Violado o direito, nasce para o titular a pretensão...) consagrou o entendimento doutrinário de que a fluência do prazo prescricional só tem início quando a vítima fica ciente do dano e pode aquilatar sua real extensão, ou seja, quando pode veicular com segurança sua pretensão reparatória.
 
[...]
 
[...] pode-se concluir que o termo a quo da contagem do prazo prescricional nas doenças ocupacionais não está vinculado à data da extinção do contrato de trabalho, ou do aparecimento da doença ou do diagnóstico, ou mesmo do afastamento. É incabível exigir da vítima o ajuizamento precoce da ação quando ainda persistam questionamentos sobre a doença, sua extensão e grau de comprometimento, a possibilidade de recuperação ou mesmo de agravamento, dentre outros. A lesão só fica mesmo caracterizada quando o empregado toma conhecimento, sem margem a dúvidas, da consolidação da doença e da estabilização dos seus efeitos na capacidade laborativa (...) (grifos acrescidos).
 
Em recente decisão envolvendo trabalhador acometido de doença decorrente de exposição ao asbesto, como no caso em apreço, a Quarta Turma deste Tribunal assim se manifestou:
 
DOENÇA OCUPACIONAL. CONTAMINAÇÃO POR AMIANTO. PRESCRIÇÃO. DANOS MORAIS. Tratando-se de doença ocupacional que evolui de forma gradual com o passar do tempo, o termo inicial do prazo prescricional para a ação reparatória é a data em que o empregado fica ciente da consolidação da doença e não a data da extinção do vínculo trabalhista. (Processo 0091500-94.2008.5.05.0102 RecOrd, ac. nº 023874/2010, Relatora Desembargadora GRAÇA BONESS, 4ª. TURMA, DJ 31/08/2010).
 
Na hipótese, ainda que se considere a data de 16/09/2005 (fls. 36), em que foi diagnosticada a lesão, a ação foi ajuizada em 1º/08/2008; portanto, dentro do prazo prescricional.
 
Assim, afasto a prejudicial de mérito e, estando a causa madura e em perfeitas condições de julgamento, passo ao exame dos pedidos correlatos, em atenção ao princípio da celeridade.
 
INDENIZAÇÃO. DANOS MORAIS E MATERIAIS
 
Trata-se de ação que envolve pedido de indenização por danos morais e materiais decorrentes do desenvolvimento de doença relacionada à exposição às fibras de amianto quando laborou para a Ré de 10/11/1986 a 4/03/1988.
 
Sustenta que a empresa nunca lhe informou sobre o perigo da inalação do mineral, nem tampouco lhe forneceu EPI e assinala que, mesmo nos momentos de pausa, os trabalhadores da Ré descansavam sobre os sacos do amianto, por absoluta falta de informação sobre os riscos à saúde.
 
O pedido merece ser deferido, em parte.
 
O atestado médico de fls. 36 aponta a presença de “placas pleurais a esquerda” e, ainda, “áreas irregulares de espessamento pleural no hemitórax esquerdo” e conclui se tratar de “alterações compatíveis com doença associada ao asbesto”.
 
Embora o perito do Juízo afirme, em sua conclusão, inexistir incapacidade laborativa (fls. 812), não há dúvida de que houve lesão à sua saúde.
 
Note-se que reconhece ser o autor “portador de placas pleurais, que são alterações pleurais não neoplásicas (não cancerígenas), decorrente da exposição ao amianto” (fls. 812) e que “Existem espessamentos pleurais”, decorrentes de tal exposição (fls. 813, itens 4 e 5).
 
É importante destacar que a Previdência Social, por meio do seu Regulamento (Decreto nº 3.048/99), com a redação alterada pelo Decreto nº 6.957/09, Anexo II, lista as doenças do sistema respiratório relacionadas com o trabalho (“Lista B”), dentre as quais estão as placas pleurais (J92), decorrentes de “exposição ocupacional a poeiras de Asbesto ou Amianto  (Z57.2) (Quadro II)”, como destacado pelo laudo pericial, às fls. 801.
 
Portanto, clara é a presença do dano e do nexo de causalidade, elementos necessários ao dever de indenizar.
 
Em relação à culpa, aponta Maria Helena Diniz, em sentido amplo, caracterizar-se pela “violação de um dever jurídico imputável a alguém, em decorrência de fato intencional ou de omissão de diligência ou cautela”,[2] abrangendo o dolo, que é a “violação intencional do dever jurídico, e a culpa em sentido estrito, caracterizada pela imperícia, imprudência ou negligência, sem qualquer deliberação de violar um dever”.[3]
 
A sua presença reside no fato de não propiciar o empregador meios adequados para evitar ou, pelo menos, minimizar os efeitos da lesão praticada contra a saúde do empregado. Friso que tal obrigação está prevista no art. 157 e seus incisos da CLT.
 
Significa afirmar que é dever do empregador propiciar um ambiente de trabalho saudável, a fim de que atenda o dever de segurança ínsito do contrato de trabalho.
 
Acrescente-se aos argumentos mencionados a regra contida o art. 19, § 1º, da Lei nº 8.213, de 24/07/1991, que informa ser a empresa responsável pela adoção e uso das medidas coletivas e individuais de proteção à saúde do trabalhador, instituindo, portanto, uma cláusula legal compulsória que aderirá ao contrato de trabalho.
 
A responsabilidade do contratante também advém da ausência de qualquer atitude no sentido de minimizar o risco presente no ambiente de trabalho, diretriz maior a ser perseguida por aquele que organiza a atividade produtiva, diante da regra estabelecida no art. 7º, XXII, da Constituição.
 
No caso dos autos, a instrução probatória revela que a empresa sequer informou aos seus empregados o risco da atividade e, por isso, muitos deles descansavam em cima dos sacos de amianto e, ainda, levavam as fibras para casa para fazer tapete, como se colhe dos trechos dos depoimentos abaixo transcritos:
 
[...] que o local onde o reclamante trabalhava tinha pó de cimento, que toda a área de produção tinha pó; que o chão ficava coberto de pó; que o depoente começou a trabalhar em 15/04/1968 e saiu em 04/03/1988; que por todo o período em que trabalhou, o depoente usava bota, capacete, mascara e luva; que o reclamante também usava os mesmos equipamentos; que não foi informado ao depoente a finalidade da máscara nem sobre a obrigatoriedade do seu uso; que a empresa nunca deu qualquer informação acerca do risco do trabalho com amianto; [...] que a limpeza dos locais de produção era feita pelos ajudantes gerais, a exemplo do reclamante; que o reclamante utilizava de vassoura, pá e carro de mão para efetuar a limpeza; que toda a produção funcionava no mesmo galpão; que as áreas eram divididas em área de máquinas e área de produção manual; que havia apenas algumas telhas dividindo alguns setores, mas que não barravam a poluição das áreas coma fibra do amianto; que a farda do depoente, era lavada em sua residência; que o reclamante usava farda; que não sabe informar onde o reclamante lavava sua farda; que a empresa nunca lavou a farda do depoente; que havia local próprio na empresa para fazer refeições; que o refeitório ficava em um galpão aberto  em local diverso da produção distava aproximadamente 100 metros da produção, isso de 1968 a aproximadamente 1976; que no refeitório havia pó de amianto, levado pela farda; que quando o ventilador batia na farda, havia a suspensão dos pó; o depoente não dormia depois da refeição; que muitos funcionários dormiam em cima do feltro que conduzia a massa; que o feltro era impregnado de pó; (testemunha do autor – fls. 878, grifos acrescidos);
 
 
 
[...] que no local onde o reclamante trabalhava havia pó de amianto; que o reclamante somente usava a máscara quando fazia trabalhos específicos de varrição e acabamento; que não sabe informar se quando o reclamante recebeu a máscara se foi informado acerca da sua finalidade e obrigatoriedade do uso; que as pessoas levavam feltro para casa para fazer tapete; que a partir de 1974, tal prática foi abolida na empresa; que não sabe informar se o feltro era doado ou vendido; que o depoente usava farda e que a mesma era lavada em sua residência; que somente a partir da década de 90, a empresa passou a lavar farda; que o reclamante também usava farda; que a empresa não lavava a farda do reclamante; que havia local próprio para fazer refeição; que a área era separada do local da produção; que não havia pó de amianto na área do refeitório; que acha que no período de 1986 a 1988 o depoente já trabalha na produção de telhas; que trabalhou no setor de moldagem até 1979; que no período de 1986 a 1988, o depoente, muito raramente comparecia ao setor em que o reclamante trabalhava; que todos, quando iam fazer refeição, iam vestidos da farda; que no refeitório tinha ventilador; que algumas fardas ficavam impregnadas de resíduos de amianto; que de 1986 a 1988, houve uma política quanto à informação da necessidade de utilização dos equipamentos de proteção no ambiente de trabalho; que a partir da década de noventa, foi aprofundado o estudo a respeito do amianto e intensificado o treinamento a respeito dos cuidados que devem ser tomados com a utilização do material (testemunha do reclamado – fls. 878/879, grifos acrescidos).
 
 
 
Se o risco está presente, como ressaltado, e o empregador não demonstra a adoção de medidas destinadas a retirá-lo ou mesmo minimizar os efeitos que possa produzir, arca com as consequências de sua incúria.
 
Além disso, não tenho dúvidas da adequação da teoria da responsabilidade objetiva para casos que tais, conforme autoriza o parágrafo único do art. 927 do Código Civil.
 
A regra em foco autoriza a que se conclua por essa forma de responsabilização, nas atividades habitualmente de risco e este não é outra coisa senão a probabilidade de causar danos à saúde de outrem, determinada pela presença, no ambiente de trabalho (no caso do empregado), de agentes nocivos, sejam estes de natureza química, física, mecânica, biológica ou ergonômica.
 
A caracterização da atividade pode decorrer da sua própria natureza – risco intrínseco –, como a fabricação de explosivos, por exemplo, ou do modo de execução, no caso daquela que, em si, não proporciona o dano, mas este surge da maneira como o labor é executado, pela combinação dos elementos utilizados, como máquinas e equipamentos, além do próprio local em si.
 
A propósito da caracterização da atividade como de risco, Carlos Alberto Bittar e Carlos Alberto Bittar Filho informam que pode basear-se em critérios naturais ou jurídicos, estando albergados, no primeiro caso, aquelas em que o perigo decorre da sua própria natureza (periculosidade intrínseca), como no transporte de valores, abastecimento de aeronaves, fabricação de explosivos e de produtos químicos, ou em virtude dos meios utilizados (substâncias, aparelhos, máquinas e instrumentos perigosos) – tomados no sentido dinâmico, postos em ação, como meios, nas mãos dos homens –; no segundo, as consagradas nas práticas legislativas e reconhecidas como tais pela jurisprudência[4].
 
Ainda é da lição dos autores indicados a observação no sentido de não ser fácil a determinação da periculosidade, apontando não apenas para a definição em leis especiais, o que incluiria o rol definido por ato administrativo da autoridade competente, como também para a relevância do papel da jurisprudência, que teria a possibilidade de caracterizar como lesiva a atividade que expõe o empregado a fatores de riscos elevados.
 
Ao lidar, habitualmente, num ambiente onde o risco de sofrer contaminação pelos agentes químicos é elevado, muito maior, aliás, em relação àquele que afeta os demais trabalhadores, não há dúvida, a meu sentir, que demonstrou o acionante a presença do nexo causal entre a sua ocupação e o dano a ele causado, com a permanente presença do fator de risco.
 
Esse, aliás, é o ponto principal da questão: a impossibilidade de eliminação do fator agressivo à saúde humana. É exatamente para casos como esse que tem lugar a regra prevista no citado parágrafo único do art. 927, do Código Civil.
 
Revela a necessidade de colocar-se o homem como centro da proteção de todo o sistema da responsabilidade e de privilegiar-se o princípio da dignidade humana como base da sociedade brasileira, o que justifica a inserção, na Carta de 1988, de várias regras em que é utilizada a diretriz da responsabilidade objetiva, de forma coerente com a evolução processada nesse campo, o que permite concluir pelo acolhimento da tese que norteia a regra inserida no precitado dispositivo legal.
 
Há atividades em que é necessário atribuir-se um tratamento especial, a fim de que sejam apartadas do regime geral da responsabilidade, em virtude do seu caráter perigoso, sempre presente na execução cotidiana do trabalho. Nesses setores não se pode analisar a controvérsia à luz da teoria da culpa; há risco maior e, por isso mesmo, quem o cria responde por ele.
 
Destaco, por oportunas, ementas de recentes acórdãos do TST, sobre a temática aqui discutida:
 
RECURSO DE REVISTA. ILEGITIMIDADE ATIVA DO ESPÓLIO. [...]. DANO MORAL. PRESCRIÇÃO. FATO OCORRIDO ANTERIORMENTE À EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 45/2004. AÇÃO AJUIZADA NA JUSTIÇA DO TRABALHO. REGRA DE TRANSIÇÃO. A incapacidade se deu em data anterior à vigência da Emenda Constitucional nº 45/2004. Logo, não parece razoável que observado o prazo prescricional vintenário (artigo 177 Código Civil-1916), previsto à época da lesão, a parte seja surpreendida com a aplicação do prazo prescricional previsto na legislação trabalhista. Considerando que a ação foi ajuizada em 13.1.2004, dentro do prazo prescricional de 3 anos contados da vigência do Código Civil de 2002 (12/01/2003) não há se falar em declaração da prescrição como pretendido pela recorrente. Recurso de revista não conhecido. DANO MORAL. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA. INDENIZAÇÃO POST MORTEM. FALECIMENTO EM DECORRÊNCIA DE DOENÇA PROFISSIONAL. CONTATO COM AMIANTO/ABESTO. A omissão da reclamada no cuidado com o meio ambiente seguro de seus empregados acarreta o reconhecimento da sua responsabilidade objetiva pelos eventos danosos que, na hipótese dos autos, não apenas eram presumíveis, mas também evitáveis. As atuais preocupações reveladas pela sociedade, no que tange às questões correlatas ao meio ambiente, às condições de trabalho, à responsabilidade social, aos valores éticos e morais, bem como a dignidade da pessoa humana, exigem do empregador estrita observância do princípio da precaução. Este princípio informa que quando houver ameaça de danos ao meio ambiente seguro e sadio do trabalho, a ausência de absoluta certeza não deve ser utilizada como meio para postergar medidas eficazes e economicamente viáveis para prevenir o dano. Mister, portanto, a adoção de critérios de prudência e vigilância a fim de evitar o dano, ainda que potencial. Trata-se de uma obrigação de resultado: a prevenção em matéria de saúde e segurança no trabalho exige do empregador o dever de antecipar e avaliar os riscos de sua atividade empresarial e a efetivação das medidas de precaução necessárias. O amianto é uma fibra mineral cancerígena e banida em vários países do mundo. Dados científicos comprovam amplamente seus efeitos danosos à saúde humana. No Brasil, o amianto é tolerado, embora não existam limites de tolerância suficientemente seguros para garantir a vida e a segurança daqueles que estão em contato diário com o amianto. Deste modo, restou comprovado o nexo de causalidade entre a conduta do empregador e o resultado danoso de que é vítima o trabalhador, configurando-se, pois a responsabilidade civil do empregador, que é subjetiva, em face da culpa, pela negligência e omissão na manutenção do ambiente de trabalho seguro. Recurso de revista não conhecido. QUANTUM INDENIZATÓRIO. TRABALHO COM AMIANTO. O recurso de revista está desfundamentado no tema, eis que a recorrente não aponta violação de dispositivo legal e/ou constitucional, tampouco traz divergência jurisprudencial a fim de fundamentar as suas razões recursais. Recurso de revista não conhecido.   (Processo: RR - 40500-98.2006.5.04.0281 Data de Julgamento: 05/05/2010, Relator Ministro: Aloysio Corrêa da Veiga, 6ª Turma, Data de Divulgação: DEJT 14/05/2010).
 
 
 
RECURSO DE REVISTA. EXCLUSÃO POLO PASSIVO. SAINT GOBAIN. Caracterizado o grupo econômico, não há falar em violação do art. 2º, § 2º, da CLT, sendo a Saint-Gobain Ltda. parte legítima a figurar no feito. Recurso de revista não conhecido. DANO MORAL. PRESCRIÇÃO. FATO OCORRIDO ANTERIORMENTE À EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 45/2004. AÇÃO AJUIZADA NA VARA CÍVEL TAMBÉM EM PERÍODO ANTERIOR. APLICAÇÃO DA PRESCRIÇÃO CÍVEL. Interposta a ação em 2002 na Justiça Comum, em relação a doença profissional ocorrida em 2001, tendo o contrato sido extinto em 1992, e apenas e tão-somente declinada a competência para a Justiça do Trabalho em 28.7.2006, entende-se que rege a prescrição da regra civil da data do ajuizamento da ação, isto é, a do artigo 177 do Código Civil/1916. Recurso de revista não conhecido. DANO MORAL. INDENIZAÇÃO. TRABALHO COM AMIANTO. Se existe nexo de causalidade entre a atividade de risco e o efetivo dano, o empregador deve responder pelos prejuízos causados à saúde do empregado, tendo em vista que a sua própria atividade econômica já implica situação de risco para o trabalhador. Assim, constatada a atividade de risco exercida pelo autor, não há como se eliminar a responsabilidade do empregador, tendo em vista o dano causado à saúde do empregado, que lhe emprestou a força de trabalho. Recurso de revista não conhecido. QUANTUM INDENIZATÓRIO. TRABALHO COM AMIANTO. No caso dos autos, o valor arbitrado não escapa aos limites da equidade, da razoabilidade, da proporcionalidade e dos mais comezinhos princípios de direito, em especial, daquele que proíbe o enriquecimento sem causa. Trata-se de doença profissional decorrente do contato com amianto durante mais de 30 anos, tendo sido constatada que a agressão ao patrimônio moral do empregado veio se perpetrando ao longo desse tempo e não se consubstanciou somente no momento em que caracterizada a incapacidade laboral definitiva do trabalhador. Tal fato, por si só, já demonstra, por parte da reclamada, o desapego a qualquer valor de dignidade humana, vida, saúde e segurança no trabalho, em relação ao reclamante, durante todo o trabalho executado ao longo do contrato de trabalho. Não há juízo de equidade que possa atribuir valor de reparação por tamanho desrespeito e sofrimento. Assim, à míngua de outros critérios, considerados: a incapacidade laboral permanente; a notória negligência da reclamada durante tão longo período; o estado físico e psicológico do autor; a inexistência de equipamentos de proteção, tem-se que o valor da reparação foi arbitrado com prudência e proporcionalidade ao dano sofrido, e traduz moderação, pois não consagra a impunidade do empregador, mas serve de desestímulo a práticas que possam retirar do trabalhador a sua dignidade. Recurso de revista não conhecido. REEMBOLSO DE REMÉDIOS E TRATAMENTOS MÉDICO-HOSPITALAR. Não há falar em enriquecimento ilícito, pois a condenação foi fixada de acordo com o convencimento do magistrado e dentro dos limites da razoabilidade. Recurso de revista não conhecido. CORREÇÃO MONETÁRIA. ÉPOCA PRÓPRIA. ARTIGO 459, PARÁGRAFO ÚNICO, DA CLT. SÚMULA Nº 381/TST . Esta C. Corte Superior já firmou jurisprudência no sentido de que a época própria para incidência da correção monetária nos salários é a do mês subsequente ao da prestação de serviços, conforme entendimento consubstanciado na Súmula 381. Assim, uma vez inobservada a data limite prevista no artigo 459 da CLT, a correção monetária deverá incidir a partir do dia 1º, nos exatos termos do verbete sumular acima citado. Recurso de revista conhecido e provido.     (TST. Processo: RR - 109300-76.2006.5.01.0051 Data de Julgamento: 25/11/2009, Relator Ministro: Aloysio Corrêa da Veiga, 6ª Turma, Data de Divulgação: DEJT 04/12/2009)
 
No que concerne aos critérios objetivos para fixação da indenização por dano moral, a legislação não os estabelece. Por sua vez, a Súmula nº 281, do STJ afastou a aplicação analógica da Lei 5.250/67, que cuida da liberdade de pensamento e de informação, ao estabelecer que "A indenização por dano moral não está sujeita à tarifação prevista na Lei de Imprensa".
 
Na lição de Caio Mário da Silva Pereira[5], o magistrado leva em conta que:
 
“a vítima deve receber uma soma que lhe compense a dor ou o sofrimento, a ser arbitrada pelo juiz, atendendo às circunstâncias de cada caso, e tendo em vista as posses do ofensor e a situação pessoal do ofendido. Não tão grande que se converta em fonte de enriquecimento, nem tão pequena que se torne inexpressiva"
 
Aguiar Dias assinala que não se deve construir a idéia de que a indenização por dano moral não possui limites. Na sua opinião, deve-se buscar um “equivalente adequado” e destaca que a “reparação será, sempre, sem nenhuma dúvida, inferior ao prejuízo experimentado”.[6]
 
Com propriedade, Caio Mário da Silva Pereira, citado por Humberto Theodoro Júnior, ensina:
 
"A vítima de uma lesão a algum daqueles direitos sem cunho patrimonial efetivo, mas ofendida em um bem jurídico que em certos casos pode ser mesmo mais valioso do que os integrantes de seu patrimônio, deve receber uma soma que lhe compense a dor ou o sofrimento, a ser arbitrada pelo juiz, atendendo às circunstâncias de cada caso, e tendo em vista as posses do ofensor e a situação pessoal do ofendido. Nem tão grande que se converta em fonte de enriquecimento, nem tão pequena que se torne inexpressiva".[7]
 
A jurisprudência sobre o tema é vasta e ressalta que se deve levar em conta na fixação o prudente arbítrio do magistrado, como retratam os acórdãos a seguir:
 
“A indenização deve ser "suficientemente expressiva para compensar a vítima pelo sofrimento, tristeza ou vexame sofrido e penalizar o causador do dano, levando em conta ainda a intensidade da culpa e a capacidade econômica dos ofensores", isto, porém, "sem chegar ao extremo de caracterizar um enriquecimento sem causa".[8]
 
"Ao magistrado compete estimar o valor da reparação de ordem moral, adotando os critérios da prudência e do bom senso e levando em estima que o quantum arbitrado representa um valor simbólico que tem por escopo não o pagamento do ultraje - a honra não tem preço -, mas a compensação moral, a reparação satisfativa devida pelo ofensor ao ofendido".[9]
 
Portanto, deve o julgador, na fixação do dano, ater-se a parâmetros que busquem atingir a ação do ofensor, de maneira a também a provocar o efeito pedagógico, além de proporcionar à vítima uma condição de vida mais adequada, em virtude daquilo que o dinheiro pode minimizar o sofrimento. Não se fala em indenizar sofrimento, mas de possibilitar um “remédio” para amenizar a dor sofrida.
 
A lesão, de acordo com o laudo pericial, não o incapacitou ou reduziu a sua capacidade de trabalho, razão porque indefiro o pedido de pensionamento mensal e vitalício e a constituição de capital.
 
Contudo, trata-se de lesão irreversível e progressiva, como atestou o perito às fls. 849/850 (item 3). De acordo, ainda, com a prova técnica realizada,
 
a presença de placas pleurais (incluindo alguns casos com espessamentos pleurais difusos) contribui de forma independente para índices baixos de espirometria, bem como associação com dispnéia. Não há evidências anatomopatológicas que indiquem que as placas pleurais se transformem em mesotelioma com o correr dos anos (Herbert, 1986), no entanto, Edge (1979) estimou o risco de trabalhadores, com placas pleurais em estaleiros, de desenvolver mesotelioma em aproximadamente 1/400 por ano (fls. 809/810).
 
Desse modo, defiro o pedido de ressarcimento dos danos materiais, que abrangem as despesas com tratamento médico e exames, a serem apurados em liquidação por artigos, diante da peculiaridade de ser a liquidação por arbitramento apenas forma excepcional, quando as demais se mostrarem inviáveis.
 
Destaque-se, ainda, a conclusão da prova de função pulmonar, de “leve Redução Capacidade Vital Forçada” (fls. 827), o que deve ser sopesado na fixação da reparação do dano moral.
 
Em acórdão proferido em processo sobre a matéria, o Des. Amílcar de Castro (Tribunal de Apelação de Minas Gerais, in Revista Forense, 93/530), salientou:
 
Causando o dano moral, fica o responsável sujeito às conseqüências do seu ato, a primeira das quais será essa de pagar uma soma que for arbitrada, conforme a gravidade do dano e a fortuna dele, responsável, a critério do Poder Judiciário, como justa reparação do prejuízo sofrido, e não como fonte de enriquecimento.
 
Destacou, mais, que na fixação da indenização deve-se buscar um valor razoável, sem permitir “enriquecer um necessitado”, nem “aumentar a fortuna de um milionário”, mas tão-somente “impor uma sanção jurídica ao responsável pelo dano moral causado”.[10] 
 
Não é outro o ensinamento de Caio Mário da Silva Pereira, ao estabelecer que duas noções devem ser levadas em consideração:
 
a) de um lado, a idéia de punição do infrator, que não pode ofender em vão a esfera jurídica alheia;
 
b) de outro lado, proporcionar à vítima uma compensação pelo dano suportado, pondo-lhe o ofensor nas mãos uma soma que não é o pretium doloris.[11]  
 
Some-se, ainda, entre os critérios doutrinariamente indicados para a definição do valor a capacidade econômica do ofensor, pois de nada valeria a reparação se não significasse um sentimento de perda econômica para aquele que lesou.
 
O que se leva em conta é a natureza do dano, pois pode representar muito mesmo para quem ganha pouco, como também de forma inversa.
 
Por fim, ressalto que em se tratando de lesão extrapatrimonial, não há o que ser indenizado. Minimiza-se o sofrimento, razão pela qual não deve levar em consideração a capacidade econômica do ofendido para diminuir o valor, porque significaria, ao fim e ao cabo, "punir" a pobreza.
 
Considerando todos esses parâmetros, reformo, pois, a sentença de origem, para condenar o reclamado ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 100.000,00 (cem mil reais).
 
Diante do exposto, DOU PROVIMENTO PARCIAL ao recurso para, afastando a prescrição, condenar a recorrida ao pagamento de R$ 100.000,00 (cem mil reais) por danos morais, além de danos materiais, apurados mediante artigos de liquidação. Inverto o ônus da sucumbência. Custas de R$ 2.000,00 em razão do novo valor atribuído à causa (R$ 100.000,00) para este fim.
 
Acordam os Desembargadores da 2ª. TURMA do Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região, À UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO PARCIAL ao recurso para, afastando a prescrição, condenar a recorrida ao pagamento de R$ 100.000,00 (cem mil reais) por danos morais, além de danos materiais, apurados mediante artigos de liquidação. Invertido o ônus da sucumbência. Custas de R$ 2.000,00 em razão do novo valor atribuído à causa (R$ 100.000,00) para este fim.
 
Salvador, 10 de Dezembro de 2010
 
 
 
 
 
CLÁUDIO BRANDÃO
 
Desembargador Relator
 
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[1] OLIVEIRA, Sebastião Geraldo de. Indenizações por Acidente de Trabalho ou Doença Ocupacional.  3ª. ed. rev., ampl e atual. São Paulo: LTr, 2007. p. 363-368.
 
[2] DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. 17. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. 7. v. p. 42.
 
[3] Id., ibid., loc. cit.
 
[4] BITTAR, Carlos Alberto; BITTAR FILHO, Carlos Alberto. Direito civil constitucional. 3. ed. rev. atual. da 2. ed. da obra O Direito civil na Constituição de 1988. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 161-170.
 
 
 
[5] PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade civil. 9. ed. rev. Rio de Janeiro: Forense.
 
[6] Da Responsabilidade Civil. 9. ed. V. II. Rio de Janeiro: Forense, 1984. p. 740.
 
[7] Responsabilidade Civil.  2. ed., Rio de Janeiro: Forense, 1990. p. 103.
 
[8] TJRJ, Ap. 4.789/93, Rel. Des. LAERSON MOURO, ac. 01.03.1994, COAD, bol. 31/94, pág. 490, nº 66.291.
 
[9] TJPR, Ap. 19.411-2, Rel. Des. OTO LUIZ SPONHOLZ, ac. 05.05.1992, in RT 66/206.
 
[10] Idem, ibidem.
 
[11] Instituições de Direito Civil.  8. ed. v. II. Rio de Janeiro: Forense, 1986.  p. 235

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