Carta O
Berro......................... .............................. ..repassem
Discurso de Luiz Inácio Lula da Silva - Doutor Honoris Causa –
Sciences Po - Paris, França - 27 de setembro de 2011
Minhas amigas e meus amigos,
É uma grande honra, para mim, receber o título de Doutor Honoris
Causa do Instituto de Ciências Políticas de Paris. Honra que se torna ainda
maior por eu ser o primeiro latino-americano a recebê-lo.
Estou profundamente grato à direção da Sciences Po e a todos os seus
professores, funcionários e alunos por me conferirem uma láurea tão
prestigiosa.
Esta casa, a um só tempo humanística e científica, é reconhecida e
admirada no mundo todo por seus elevados propósitos e pela excelência do seu
corpo docente e discente.
É uma instituição que representa de modo exemplar o compromisso da
França com a liberdade intelectual, a dignidade da política e o aperfeiçoamento
permanente da democracia.
Representa essa França consciente de suas conquistas materiais e
espirituais, ciosa de seus valores civilizatórios, mas nem por isso menos aberta
a povos e mentalidades diferentes, à compreensão do outro.
Essa França insubmissa e libertária que, durante séculos, inspirou –
e continua, de alguma forma, inspirando – a trajetória de muitos países, entre
eles o Brasil.
Essa França que, desde o século 18 até os dias atuais, é tão
relevante para o Brasil, seja no terreno das ideias políticas e sociais, seja na
esfera da educação e da cultura, seja no que se refere às parcerias produtivas e
tecnológicas.
Minhas amigas e meus amigos,
Mais do que um reconhecimento pessoal, acredito que este título de
Doutor Honoris Causa é uma homenagem ao povo brasileiro, que nos últimos anos
vem realizando, de modo pacífico e democrático, uma verdadeira revolução
econômica e social, dando um enorme salto histórico rumo à prosperidade e à
justiça. Depois de prolongada estagnação, o Brasil voltou a crescer de modo
vigoroso e continuado, gerando empregos, distribuindo renda e promovendo
inclusão social.
Deixamos para trás um passado de frustrações e ceticismo. Os
brasileiros e as brasileiras voltaram a acreditar em si mesmos e na sua
capacidade de resolver problemas e superar obstáculos, por mais difíceis que
sejam.
Graças a um novo projeto de desenvolvimento nacional, com forte
envolvimento da sociedade e intensa participação popular, conseguimos tirar 28
milhões de pessoas da miséria e levamos 39 milhões de pessoas para a classe
média, no maior processo de mobilidade social da nossa história.
Em oito anos e meio foram criados 16 milhões de novos empregos
formais. O salário mínimo teve um aumento real de 62%, e todas as categorias de
trabalhadores fizeram acordos salariais com ganhos acima da
inflação.
Além disso, implantamos vários programas de transferência direta de
renda, dos quais se destaca o Bolsa Família, que é o principal instrumento do
Fome Zero e, no final do ano passado, beneficiava 52 milhões de
pessoas.
Dessa forma, a desigualdade entre os brasileiros atingiu o menor
patamar em 50 anos. Nos últimos dez anos, a renda per capita dos 10% mais ricos
aumentou 10%, enquanto a dos 50% brasileiros mais pobres teve um ganho real de
68%.
O consumo se ampliou em todas as classes, mas no segmento popular
cresceu sete vezes.
Os pobres passaram a ser tratados como cidadãos. Governamos para
todos os brasileiros e não apenas para um terço da população, como habitualmente
acontecia.
Acreditamos firmemente que o desenvolvimento econômico precisa estar
a serviço da redução das desigualdades sociais, sem paternalismo, promovendo a
inclusão das pessoas mais pobres à plena cidadania.
Acreditamos, igualmente, que isso pode, deve e será feito sem que se
descuide do equilíbrio macroeconômico, combatendo com firmeza a
inflação.
Minhas amigas e meus amigos,
Ao mesmo tempo que resgatávamos grande parte de nossa dívida social,
trabalhamos para modernizar o país, preparando-o para os desafios produtivos e
tecnológicos do século 21.
Investimos fortemente em educação, pesquisa e desenvolvimento.
Orgulho-me de ter criado 14 novas universidades federais e 126 extensões
universitárias, democratizando e interiorizando o acesso ao ensino
público.
Também lançamos o Reuni, um programa para fortalecer o ensino público
universitário, com a valorização dos docentes.
Ele contribuiu para que dobrássemos o número de matrículas nas
instituições federais.
Mas não ficamos restritos a isso e instituímos o Prouni, um sistema
inovador de bolsas de estudo em universidades particulares. Com ele, garantimos
que 912 mil jovens de baixa renda pudessem cursar o ensino
superior.
E a oportunidade não foi desperdiçada: os jovens com bolsas do Prouni
têm-se destacado em todas as áreas, liderando em muitos casos os exames
nacionais de avaliação feitos pelo Ministério da Educação. Ou seja, bastou uma
chance e a juventude brasileira deu firme resposta ao mito elitista segundo o
qual a qualidade é incompatível com a ampliação das
oportunidades.
Também me orgulho muito de termos inaugurado 214 novas escolas
técnicas federais, que criaram possibilidades inéditas de formação profissional
para a juventude.
A boa qualidade do ensino na rede de escolas técnicas federais também
abre as portas para as universidades, mesmo para quem trabalha durante o dia
inteiro, porque durante o meu governo aumentamos o número de vagas nos cursos
universitários noturnos.
Esses jovens têm que continuar sonhando, têm que lutar para
conquistar o doutoramento, para trabalhar nos diversos centros de pesquisa e
desenvolvimento tecnológico que existem no Brasil.
Deixamos de considerar a educação como um gasto para tratá-la como
investimento que muda a vida das pessoas e do país. Por isso, em meus dois
mandatos, triplicamos o orçamento do Ministério da Educação, que saltou de 17
bilhões de reais para 65 bilhões de reais em 2010.
Essas mudanças eram imprescindíveis, pois a garantia de acesso à
educação de qualidade, da pré-escola aos cursos de pós-graduação, é um dos
principais instrumentos para promover a igualdade social, combater a pobreza e
assegurar um desenvolvimento econômico, científico e tecnológico sustentável em
longo prazo.
A educação foi colocada como prioridade estratégica para o país. O
investimento público direto em educação passou de 3,9% do Produto Interno Bruto
em 2000 para 5% em 2009. E, agora, a presidenta Dilma Rousseff assumiu o
compromisso de ampliar o investimento em educação progressivamente até atingir
7% do Produto Interno Bruto.
Minhas amigas e meus amigos,
O Brasil já tem muito a mostrar no segmento de pesquisa e
desenvolvimento. A Lei da Inovação, aprovada em dezembro de 2004, incentivou as
universidades a compartilhar seus projetos de pesquisa e desenvolvimento com as
empresas públicas e privadas, para alavancar a inovação tecnológica no ambiente
produtivo.
O número de cientistas envolvidos em pesquisa e desenvolvimento
passou de 126 mil em 2000 para 211 mil em 2008. E o número de patentes
depositadas no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) cresceu de 21
mil em 2000 para 280 mil em 2009.
Além disso, o governo federal destinou 41 bilhões de reais ao setor
de pesquisa e inovação no período de 2007 a 2010, através do Programa de
Aceleração do Crescimento.
Minhas amigas e meus amigos,
Uma das preocupações do meu governo – e que continua a ser um firme
compromisso da presidenta Dilma – foi garantir que o crescimento econômico e os
investimentos estruturantes fossem sustentáveis do ponto de vista
ambiental.
Nos últimos anos, o Brasil superou a falsa contradição que opunha o
desenvolvimento à sustentabilidade ambiental. Nesse período, a taxa de
desmatamento caiu 75%.
Em nosso governo, fixamos como meta reduzir as emissões de CO2 entre
36% e 39% até 2020. Esse compromisso foi incorporado à Política Nacional de
Mudanças Climáticas, apresentada em Copenhague, em dezembro de 2009, e
posteriormente transformada em lei pelo Congresso Nacional.
O Brasil é uma referência no enfrentamento dos desafios ambientais do
século 21, pois é responsável por 74% das unidades de conservação criadas no
mundo desde 2003. Também alcançamos recentemente o menor nível de desmatamento
dos últimos 22 anos.
Minhas amigas e meus amigos, os avanços que conquistamos nos últimos
anos foram possíveis porque praticamos intensamente a democracia. Não nos
limitamos a respeitá-la – o que é um dever –, mas levamos suas possibilidades ao
limite, promovendo um amplo processo de participação social na definição das
políticas públicas.
Estabelecemos uma nova relação do Estado com a sociedade, na qual
todos os setores sociais foram ouvidos, mobilizados, e puderam discutir não
somente com o governo, mas também entre eles próprios. Multiplicaram-se os
canais de interlocução da sociedade com o Estado, o que contribuiu de modo
decisivo para que crescimento econômico e desenvolvimento social caminhassem
juntos.
Para tanto, realizamos 74 conferências nacionais entre 2003 e 2010,
precedidas por reuniões em níveis municipal e estadual, que contaram com a
presença de cerca de 5 milhões de pessoas.
Discutimos e aprofundamos nessas conferências temas importantes: do
meio ambiente à segurança pública; dos transportes à diversidade sexual; dos
direitos dos indígenas às políticas de telecomunicações; da igualdade racial à
política nacional de saúde, dentre muitos outros.
Conselhos de políticas públicas, com ampla representação popular,
foram criados junto a todos os ministérios.
Em outras palavras, apostamos decididamente na política. Porque
sempre acreditamos na força da política como promotora da emancipação individual
e coletiva.
A participação política é o melhor antídoto contra a alienação e as
tentações autoritárias.
Eu próprio sou produto da política. A luta sindical me deu a
convicção de que era necessário incorporar os trabalhadores às decisões
políticas.
Foi por isso que, em 1980, criamos o Partido dos Trabalhadores, que
em menos de 20 anos tornou-se o maior partido de esquerda da América Latina e
chegou à Presidência da República. Também construímos a maior a central sindical
da América Latina, a Confederação Única dos Trabalhadores.
Tenho a plena convicção de que os problemas da sociedade só podem ser
resolvidos com mais democracia e mais envolvimento da sociedade no exercício do
poder.
Minhas amigas e meus amigos,
O Brasil não está sozinho nessa trajetória virtuosa, que reuniu
democracia, desenvolvimento econômico e justiça social.
A esperança progressista do mundo, hoje, navega no vento que sopra do
Sul.
A América do Sul não é mais o estuário dos problemas do mundo, e sim
a mais promissora fronteira da luta pela justiça social em nosso
tempo.
Sem os países em desenvolvimento, não será possível abrir um novo
ciclo de expansão que combine crescimento, combate à fome e à pobreza, redução
das desigualdades sociais e preservação ambiental.
No momento em que se está constituindo um mundo multipolar, a América
do Sul afirma a sua presença no plano internacional, renovando a confiança em si
e na capacidade de seus povos de construir um destino comum de democracia e
crescimento econômico com inclusão social.
Vivemos numa região de paz. Não há ódio religioso entre nós. Os
governantes de todos os nossos países foram eleitos em pleitos
democráticos e com ampla participação popular. A democracia é o nosso idioma
comum.
Minhas amigas e meus amigos,
Avançamos muito no Brasil nos últimos anos. Ampliamos a inclusão
social e a democracia se fortalece cada vez mais. Elegemos, pela primeira vez na
nossa história, uma mulher para a Presidência da República.
Fizemos muito, mas ainda há muito por ser feito. E o governo da
presidenta Dilma Rousseff assume esta responsabilidade.
Lançou o programa Brasil sem Miséria para erradicar totalmente a
extrema pobreza.
Fortaleceu a área da educação, ao ampliar o programa e ensino técnico
e aumentar o número de bolsas de estudos no exterior.
O lançamento de uma nova política industrial, com o programa Brasil
Maior, fortalecerá a inovação e a competitividade.
Por último, quero enfatizar que o conhecimento e a informação são
cada vez mais importantes para o aprimoramento espiritual da Humanidade e também
para viabilizar o progresso econômico e o bem-estar dos
povos.
O governante que não enxerga isso, não está preparado para governar
uma Nação. Governante que não sonha não transmite esperança. Agradeço novamente
à Science Po por ter sido agraciado o título de Doutor Honoris Causa e estou
honrado por fazer parte do seleto grupo de pessoas que mereceram esta
honra.
Muito
obrigado.
______________________________
No hay comentarios:
Publicar un comentario